sexta-feira, 23 de junho de 2017

Tempos orwellianos

A manipulação na política é tão antiga quanto as cidades. A escala em que ela começou a ser usada tem porém vindo sempre a aumentar exponencialmente, também como resultado do crescimento demográfico. 

Primeiro a invenção da imprensa permitiu atingir públicos mais vastos. Depois o iluminismo produziu uma doutrina acerca do uso da propaganda e outros meios mais subtis de manipulação das populações. A revolução industrial gerou as ideologias e delas emanaram os regimes totalitários. Nestes a propaganda é usada de forma deliberada, como um instrumento de poder, visando especificamente a defesa do regime e a adesão e controlo das massas.

Com a derrota dos regimes nazi e do comunista não existiam à partida razões para a propaganda: a democracia liberal e o liberalismo económico tinham vencido a guerra mundial militar e ideologicamente. 

A propaganda parecia assim relegada para um plano secundário, usada sobretudo pelas grandes multinacionais para vender os seus produtos ao público. 

No entanto os media de massas são demasiado poderosos para não serem instrumentalizados. E de facto rapidamente o foram.

A manipulação começou certamente antes (há a questão da falsificação dos relatos sobre armas de destruição maciça e a falta de escrutínio da imprensa) mas é com Obama que ela atinge patamares diferentes. Por razões que não vale a pena esmiuçar, Obama foi apoiado quase unanimemente pelos media, de forma completamente aberta e declarada. A coisa foi assumida: muitos jornalistas consideravam e declaravam publicamente que era sua obrigação contribuir para a eleição de Obama. Ora isto é completamente contrário às obrigações e aos deveres deontológicos do jornalismo, nomeadamente os deveres de independência e isenção. Pelo contrário nessa altura os média comportaram-se como agentes políticos e partidários.

No entanto neste momento as coisas subiram um novo grau, um grau muito perigoso. Neste momento os media já não se limitam a ser um pouco mais favoráveis a um político ou partido face a outro: neste momento fabricam notícias falsas, omitem factos e mentem deliberadamente ao público na prossecução do seu objectivo político.

Isto é muito perigoso. Todos compreendemos que os media e as agências noticiosas em geral são compostas por homens, os quais não são isentos de paixões e idiossincrasias. Nessa medida a isenção absoluta é uma impossibilidade. Mas se começamos a perceber que o móbil da acção jornalística já não é a informação e a busca da verdade dos factos mas sim a prossecução de agendas; se começamos a perceber que os jornalistas não são agentes tendencialmente neutros mas agentes políticos que não hesitam em distorcer, omitir, manipular e criar artificialmente narrativas para promover aquilo que acham ser os valores "correctos"; então entramos numa nova fase na qual deixamos de poder acreditar seja no que fôr e deixamos de ter um referencial comum. Nessa fase deixa de haver verdade e deixa de haver diálogo.

Vivemos perigosos tempos orwellianos, na qual uma construção artificial ameaça sobrepor-se à realidade, com o objectivo de manipular as consciências das populações. Como disse noutro momento, a tirania pode estar ao virar da esquina, assim como a guerra.













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